06 agosto 2007

Hiroshima

Hoje é o 62º aniversário do uso da bomba atómica na cidade de Hiroshima. À duas semanas visitei a cidade.

Antes de mais quero avisar que aqui está escrita a minha opinião sobre o bombardeamento. É uma opinião parcial e sem qualquer autoridade no assunto.

Este é o edifício agora conhecido como Gembaku Dome, um dos poucos que sustentou o impacto da bomba atómica (justamente porque esta explodiu imediatamente por cima a cerca de 600m, e as paredes são mais resistentes a esforços verticais que horizontais).

Hiroshima

À primeira vista parece apenas um edifício em ruínas. A imagem ganha mais impacto quando vemos fotografias tiradas logo após a explosão, e se vê pouco mais restou para além destas ruínas.

Hiroshima

Cerca de 70000 pessoas morreram imediatamente com a explosão. Outras tantas acabariam por morrer nos meses seguintes devido às queimaduras e radiação. Entre essas estava uma criança chamada Sadako que, inspirada por um provérbio popular em que seria concedido um desejo a quem fizesse 1000 pássaros de papel, dobrou centenas mas acabou por morrer. Foi erguido um monumento em memória da Sadako e de muitas outras crianças vítimas da explosão.

Hiroshima

Ao lado deste monumento são recolhidos pássaros de papel feitos por crianças de todo o Japão. Em toda a zona perto do ground zero existem vários outros monumentos em memória das vítimas.

Aí também está um museu sobre o bombardeamento, que focava tudo: desde o cenário político pré- e pós-guerra, funcionamento da bomba, ao horrendos efeitos da explosão no ser humano. Eis uma das maquetes presente na exposição que mostra antes e depois da bomba:

Hiroshima Hiroshima

Uma das primeiras coisas que salta a vista é que o alvo foi a população cívil, e uma pergunta-se com que propósito ou direito? Na verdade, quer antes quer depois de visitar Hiroshima foram muitas as perguntas que me surgiram. Com a minha mente sistemática, por vários dias li tudo o que pude sobre o tema, tentando classificar as coisas em termos de certo e errado, bons e maus, vitimas e criminosos. Quanto mais lia mais longe parecia de encontrar uma reposta simples e cabal, pois ninguém está isento de culpas.

No parque perto do museu estava uma exposição clandestina de posters que reclamava mostrar a verdade sobre a guerra. Já tinha ouvido o argumento, pois é frequentemente recitado pelos Japoneses:

  • A população Japonesa era oprimida e foi forçada a ir para a guerra pelo imperador e pelas chefias militares.
  • Muitos Japoneses lutaram na Ásia sem quaisquer condições e muitos foram os que morreram vítimas de doenças, e não em combate.
  • Os Estados Unidos quando fizeram um embargo à exportação de petróleo ao Japão sabiam perfeitamente que o Japão não teria outro remédio senão entrar em guerra com o Estados Unidos, e fizeram tal porque tinham motivos ulteriores na Ásia (e a prova é que usaram o Japão como trampolim para as guerra da Coreia e do Vietname).
  • Os EUA lançaram bombas (atómicas e não só) sobre as cidades Japonesas alvejando a população cívil.
  • As tropas EUA eram rudes e maltrataram os Japoneses após a rendição.

Talvez o mais surpreendente é que corresponde tudo factos mais ou menos comprovados. Só que deixa de fora o resto dos factos:

  • O Japão tinha como objectivo liberar a Ásia das potências imperialistas ocidentais, mas na prática aspirava ao mesmo.
  • O Japão estava a levar a cabo uma guerra total, onde todos (incluindo mulheres e crianças) participavam no esforço da guerra.
  • As tropas Japonesas fizeram actos horrendos de extermínio, violação em massa, que ainda hoje são a origem de más relações diplomáticas com os países vizinhos.
  • Muitos Coreanos foram escravizados e levados a trabalhar no Japão. Muitos foram igualmente vítimas da bomba atómica em Hiroshima e foram precisos dezenas de anos até serem reconhecidos estatuto de vítima igual ao das vítimas Japonesas.

(E estes argumentos de ambos os lados ainda fazem correr muita tinha nos jornais; pois os governos actuais, quer do Japão e dos países vizinhos, insistem em reescrever a história impondo as suas verdades nos manuais escolares...)

Um dos posters do museu expressa bem a minha opinião após muito coçar a cabeça com este assunto:

Hiroshima Hiroshima

No fundo, a guerra torna quase todos simultaneamente em vitimas e criminosos. E além de andar a debater a verdadeira história do que aconteceu ou deveria ter acontecido à mais de 50 anos, mais ênfase deve ser dada a aprender com ela, e eliminar a guerra que ainda acontece no presente e salvar quem pode ser salvo.

Mas o que mais me emocionou foi a força de espírito e de solidariedade com que a população de Hiroshima superou a dor e reconstrui uma cidade devastada. Que o ser humano não tem limite no mal que pode infligir ao seu semelhante já deixou de ser surpreendente, mas enche sempre de esperança saber que também não tem limites para o altruísmo.

Hiroshima é agora uma cidade cheia de vida.

Hiroshima